terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Aos Meus Amigos - 3 (Parte II)

(Não acompanhou desde o inicio? Então aproveite, em: http://blagoiaba.blogspot.com.br/2013/09/aos-meus-amigos-introducao.html )


_ Vô, posso dormir aqui?
_ Nada disso, Leo. Você está de castigo, lembra?
_ Deixa ele, Marilda. Eu e sua mãe ficaremos de olho nele. Tenho certeza que o Leo não vai desobedecer.
Fazia tempo que eu não dormia na casa do vô Tonico. Cada vez mais o que antes era a diversão começou a se tornar obrigação, pois ao invés de querermos ir pra casa dele almoçar ou jantar queríamos agora sair e nos divertir. Mas é claro que eu ainda amava muito os dois. Lá não tinha telefone, o que me deixava isolado de qualquer amigo. Minha esperança era que algum primo fosse pra lá também, mas, como disse, essa não era mais a prioridade deles também.
_ Vou caminhar de manhã Leo, como sempre. Quer ir?
_ Tá bom, vô. Pode me chamar. – Respondi, desanimado na frente da televisão.
De manhã a vó Cotinha sempre acordava cedinho pra preparar café pro vô Tonico, e quando eu era criança ela sempre me chamava para que fosse me deitar com ele, coisa que eu adorava. Percebi que ela havia se levantado e os ouvi conversar.
_ Bem? Eu chamo o Leo? Não sei se ele ainda gosta de vir se deitar com você.
_ Acho melhor não querida. Ele já tá grande, e talvez pense que isso é coisa de criança.
Aquilo me atingiu com tudo, e quase comecei a chorar. Não aguentei, me levantei e fui até o quarto do vô Tonico, me deitando ao seu lado.
_ Leo? Tá tudo bem?
_ Tá sim, vô. Tá tudo ótimo.
E o abracei como sempre fazia. Percebi que a vó Cotinha observava de fora do quarto.
Como se o tempo tivesse voltado, pouco depois aparece a vó Cotinha com o café do vô Tonico e uma caneca de sopinha de pão, que era leite com achocolatado e pão encharcado dentro, que eu adorava desde pequeno. Aquilo me encheu de alegria e lembranças. Como podemos nos esquecer dessas coisas boas quando crescemos?

Sua mãe me contou o que houve Leo. – Disse o vô Tonico enquanto caminhávamos em sentido ao antigo matadouro, que agora era um campinho de futebol de uma empresa privada. – Por que fez isso? Você sempre foi tão obediente.
Não sabia o que dizer, pois nem eu sabia direito o porquê daquilo. Como explicar que eu era visto como medroso pelos meus amigos?
_ Só queria ficar com os meus amigos, vô.
_ Você tem a vida toda pra isso, Leo. Hoje mesmo poderia estar com eles se não estivesse de castigo.
_ Mas todos eles vão embora mais tarde de sábado. Só quis ficar um pouco mais, acompanha-los, ver o que faziam até mais tarde.
_ E você pensou em pedir isso aos seus pais? Explicar essa sua vontade? Talvez eles tivessem deixado sem precisar desobedece-los.
Fiquei quieto ao perceber que ele tinha razão, apesar de saber que não era essa a real razão para ter ficado até mais tarde.
_ Vamos voltar Leo. Até aqui já está bom.
_ Mas não estamos nem na metade vô! Nem chegamos perto da pista.
_ Faz tempo que não chego até lá, Leo. Meu limite é aqui.
Mais uma vez fiquei quieto, dessa vez por perceber o quanto ele estava velho. Foi muito estanho, pois pela primeira vez me passou pela cabeça que um dia ele nos deixará, e imediatamente olhei para onde antes ficava o velho matadouro, recordando antigas lições.

Meus avós sempre comiam no mesmo prato, juntos. Costume de uma época em que a vida dos dois era mais difícil e que tinham que fazer isso por não haver pratos para todos. Meu lugar desde pequeno era ao lado do vô Tonico na mesa, e era lá que eu estava no momento, pronto para almoçar. Além de nós três também estavam meus pais e a tia Matilde, que era divorciada a muitos anos do tio Ribeiro, do qual nem tínhamos contato.
_ Pegou todos os remédios, mãe?
_ Peguei sim Marilda.
E então reparei na pequena montanha de remédios que minha vó precisava tomar. Sabia que de tempo em tempo meus pais ou algum outro tio a levava ao médico em outra cidade, mas não sabia ao certo por quê.
_ Pra que tanto remédio, vó? – Perguntei.
_ Sua vó tem diabetes e reumatismo, Leo. Já devia saber. – Disse meu pai, que gostava muito do vô e da vó, já que não tinha o mesmo contato com seus próprios pais.
_ Deixa ele perguntar Francisco. Nessa idade já não reparam nessas coisas. Têm seus próprios interesses.
_ Mas já dá pra ver que ele não é mais o mesmo, né mãe? O carinho que ele tinha por vocês, e agora bebendo por aí e chegando tarde... Fora as más companhias com aquele tal de Vini.
_ Não fala assim do Vini! – Disse em tom alto. – Você não o conhece. Ele é meu amigo e é muito gente boa.
_ Tô te falando, Leo: Se te ver andando com ele de novo...
_ Já chega vocês dois! – Interrompe o vô Tonico. – Estamos todos almoçando e isso não é hora para brigas.
_ Tá certo pai. Mas esse menino não é mais o mesmo.
E almoçamos quase que em silêncio, fora um ou outro comentário puxados pela vó Cotinha ou pela tia Matilde.

Passei a tarde com meus avós, jogando baralho ou assistindo televisão. Os dois tinham uma vida bem calma, e eram grandes companheiros um do outro. O vô Tonico adorava tomar caipirinha e fumava bastante, o que sempre dava uma vontade de fumar e beber também. Claro que cigarro eu não ousaria pedir, mas vez ou outra pedia um gole da caipirinha.
_ Só molha o bico, heim? – Era o que ele sempre dizia.
No meio da tarde ouço alguém me chamar, e quando olho por cima do muro percebo que era o Vini, ficando sem saber o que fazer.
_ Tão te chamando Leo. Não vai ver quem é? – Disse a vó Cotinha enquanto preparava um bolo de fubá.
_ Já vi daqui vó. É o Vini. Mas minha mãe não quer que eu fale com ele.
_ Pode ir, Leo. – Disse o vô Tonico. – Mas não saia da frente de casa.
E assim o fiz. Desci a escada e fui até o portão. O Vini veio em minha direção.
_ Ou. Seu primo disse que você tá de castigo.
_ É. Fim de semana sem sair de casa. Pelo menos me deixaram ficar aqui.
_ Chato heim? Ia te chamar pra dar um rolê de bike e fumar uns cigarros, mas acho que não vai rolar, né?
_ Bem que eu queria, mas sem chance.
_ Escuta. Você não tem uma grana pra me emprestar? No outro fim de semana te pago.
Por alguma razão eu disse que não, sendo que eu tinha um pouco de dinheiro no qual certamente teria emprestado a um amigo, mas naquela hora não me senti à vontade para aquilo.
_ Firmeza então. Fim de semana a gente se fala. Até mais, Leo. – E foi embora.
Entrei e me dirigi até meus avós, que continuavam no mesmo lugar: a vó preparando o bolo e o vô ouvindo seu radinho de pilha enquanto tomava caipirinha.
_ Vocês vão falar pra minha mãe que eu conversei com o Vini?
_ Você não fez nada de errado Leo. Não tem por que contarmos. – Disse o vô Tonico. Então me sentei próximo a ele e fiquei desenhando num pedaço de papel de pão que minha vó sempre guardava.

À noite, pouco antes do jantar, minha mãe, meu pai, meu irmão, minha irmã e o noivo dela apareceram na casa dos meus avós, o que achei estranho por estarem todos juntos daquele jeito. Não que isso fosse fora do comum, mas não num sábado à noite. A Rosália e seu noivo, o Roberto, estavam um tanto quietos, com um clima estranho no ar. Ela parecia que tinha chorado.
_ Vão se arrumar. – Disse meu pai para mim e meus avós. - Vamos sair pra comemorar.
Aquilo soou estranho para nós, pois suas feições não pareciam com as de quem fossem comemorar algo. Até que a vó Cotinha se arriscou:
_ Comemorar o que Francisco?
E foi minha mãe quem respondeu:
_ A Rosália tá grávida mãe. Por isso marcaram o casamento. Hoje que nos contaram.
A Rosália abraçou o Roberto e começaram a chorar. O vô Tonico foi até eles e os abraçou:
_ Certamente temos que comemorar. Uma nova criança na família é sempre uma benção.
                     E, quase que automaticamente, todos se abraçaram e começaram a chorar, até mesmo meu irmão e eu.

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terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Aos Meus Amigos - 2 (Parte II)

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Depois da primeira bebedeira minha mãe adotou a prática de ter que chama-la para abrir a porta depois que chegávamos de uma balada, cheirando nossa boca para saber se havíamos bebido, o que conseguia driblar facilmente com a técnica ensinada pelo André de abrir a boca mas soltar o ar pelas narinas, além, é claro, de uma boa e forte bala na boca. Dificilmente meu irmão e eu chegávamos juntos, mas ainda assim tínhamos que chama-la. Minha irmã estava com o casamento marcado e, por isso, ganhara o direito de dormir na casa do agora noivo, já não sendo mais um problema para meus pais.
Como meu irmão era mais velho podia chegar um pouco mais tarde do que eu, mas isso quase nunca acontecia. Meu horário limite era duas da manhã, e o dele as três. Por se tratar de uma cidade pequena íamos a pé para todos os lugares de forma que tínhamos bastante liberdade.
_ Tchau mãe. Estamos saindo. – Anunciei.
_ juízo heim! Não esquece de me chamar quando chegarem. Lou cuida do seu irmão.
_ Tá.
Naquela noite iriamos para a boate. Era a única da cidade e onde todos se encontravam. O roteiro era basicamente o mesmo: lanche com os amigos, volta no centro até por volta da meia noite e boate. Meu irmão e eu seguíamos juntos até encontrarmos nossas turmas, e então, adeus.
_ E aí moçada? – Cumprimentei ao encontrar o André, o Jonatan e o Manezinho no lanche. – O Vini não apareceu ainda?
_ Deve tá pra chegar. E aí, comprou o cigarro? – Perguntou o André.
_ Ainda não. Se te der o dinheiro você compra?
_ De novo essa história Leo? Você tem que criar coragem e comprar. Ninguém liga pra idade, só querem vender. – Disse o Jonatan, irritado.
Fiquei quieto, com a cabeça baixa, até que o Manezinho se pronunciou.
_ Daqui Leo. Eu vou.
_ Mas Manezinho, você nem fuma! – Disse, espantado.
_ Não fumo, mas posso comprar. Me dá o dinheiro.
Fiquei um pouco sem graça, mas o fiz, e tempo depois ele volta com o cigarro. Fiquei me sentindo um bosta.
_ Como foi? – Perguntei.
_ Fácil.
E me senti mais bosta ainda.
O Vini chegou e fomos comer lanche, mas o Vini não comia nunca, só nos acompanhava, sempre dizendo que já tinha jantado. Demos um rolê no centro até chegar a hora de ir pra boate. Percebi que o Vini combinava alguma coisa com o André e o Jonatan.
_ Que tá pegando? – Quis saber.
_ O Vini tá sem grana para a boate, e estamos armando um esquema. – Respondeu o André.
_ É. – Disse o Jonatan. – Parece que se você colocar um pouco de álcool nas costas da mão e alguém que já tem o carimbo de entrada colar a mão por cima consegue passar o carimbo.
_ Verdade! Vamos tentar.
O Vini já tinha saído com um pouco de álcool num potinho, então o Manezinho, o André e eu entramos, tendo as mãos carimbadas. Pouco depois o André e o Manezinho saíram com o objetivo de passar o carimbo, e eu fiquei aguardando. Pouco mais de dez minutos depois estavam todos lá, de modo que o Jonatan aproveitou para entrar de graça também, com a promessa de usar o dinheiro da entrada para comprar bebidas para todos nós, e assim descobrimos um jeito de economizar a entrada para beber mais. Só fiquei incomodado por terem chamado o Manezinho para fazer o esquema e não eu...
A boate estava lotada, mal dando para andar. Aos poucos íamos encontrando conhecidos, conversando um pouco e voltando a tentar andar, sempre trombando em outros conhecidos ou paqueras.
_ A Jéssica tá gostosa pra caramba hoje. – Comentei.
_ E se tá! Será que tenho chance? – Quis saber o Jonatan.
_ Desencana. Nenhum de nós tem. Ela só sai com cara mais velho. – Já desanimou o André. E continuamos a andar.
_ Quem pega a próxima rodada? – Perguntou o Vini.
_ Vai você Leo. – Sugeriu o Jonatan.
_ Ok. – Respondi.
Peguei o dinheiro e me dirigi ao bar com o objetivo de comprar três martinis, que dividiríamos. Me coloquei na fila e pouco depois senti me cutucarem o ombro. Olhei.
_ Que você vai comprar?
Era meu irmão e, apesar de saber que eu bebia, era louco pra me pegar no flagra pra poder tirar proveito depois.
_ Um refri. – Disfarcei.
_ Então vou ficar aqui com você. Vou comprar um pra mim também.
“Babaca”, pensei, pois sabia das suas reais intenções. Chegou minha vez na fila e pedi um refrigerante. Dei um sorriso amarelo para ele e sai. Mal dei dois passos para me afastar e dei de cara com o Vini.
_ Pegou as fichas? Vamos pro bar que a galera tá sedenta.
Fiquei sem reação e, ao perceber minha cara, pegou a ficha da minha mão.
_ Porra Leo! Que merda é essa?
_ O babaca do meu irmão colou em mim e ai... – Nem terminei de falar quando o Vini desabafou.
_ Você é muito medroso Leo. Garanto que se pedisse pra você fazer o lance do carimbo você não toparia por medo.
Aquilo bateu forte em mim e, embora tenha pensado em responder, não saia nada da minha boca.
_ Da aqui que eu compro. – Disse o Vini já tirando o dinheiro de mim.

A noite foi passando com todo mundo se divertindo menos eu, que estava quieto e pensativo. Quando o relógio marcou uma e quarenta o Manezinho anunciou:
_ Tô indo galera. Deu meu horário. Vamos Leo?
_ Vou ficar até mais tarde hoje. – Disse quase sem soltar as palavras. Todos olharam para mim.
_ Mas você não tem que chegar às duas horas também? – insistiu o Manezinho.
_ Tenho, mas não vou. Minha mãe não vai nem perceber.
_ Leo, sua mãe sempre acorda, você sabe disso. É melhor você ir. – Disse o André, que não tinha hora para ir embora.
_ Não tenho medo da minha mãe. Não sou medroso. – Disse, fingindo convicção. Todos se espantaram, mas não falaram nada.
O Manezinho foi embora e restaram o André, o Jonatan, o Vini e eu. Meu irmão já não estava mais por lá havia um tempo, e fiquei até acabar a boate por volta das três e meia. Saímos de lá e fomos para frente da igreja comer cachorro-quente. Por volta das quatro e dez o André se despediu.
_ Tô indo nessa pessoal. Tô caindo de sono. Você vai ficar ainda Leo?
Olhei para o Vini, que deu um leve sorriso.
_ Vou sim. Mais um pouco.
_ Bem. Se sua mãe te matar me tira dessa, heim?
_ Já disse que não tenho medo...
Fumamos uns cigarros e pouco depois o Jonatan também foi embora, mas esperei até que o Vini também quisesse ir, já por volta das cinco da manhã.
_ A gente se fala mais tarde.
_ Beleza.
Chegando em casa vejo a luz da sala acesa, e aquilo me apavora. Mal abro o portão e minha mãe já destranca a porta, saindo e me encarando.
_ Onde você estava até uma hora dessas?
_ Ah Mãe! Não enche!
_ O que você disse? Repete se tiver coragem!
Aquela palavra outra vez, coragem. Mas dessa vez o medo foi bem maior e me calei.
_ Quero saber com quem você estava.
_ Com o Vini.
_ É aquele moleque que eu não gosto que mora perto da casa da vó, não é?
_ É, mas...
_ Nada de mas. Nunca fui com a cara dele e não quero você andando mais com ele, entendeu bem?
_ Mas mãe...
_ Já disse e pronto. E você está de castigo. Duas semanas sem sair.
_ Você fala isso dele só porquê ele é podre.
_ Eu sou sua mãe e sei o que é melhor pra você. Aquele menino não presta. Não quero mais você com ele. Agora vai para a cama que amanhã seu pai e eu vamos ter uma conversa séria com você.

Dessa vez obedeci, com os olhos cheios de lágrimas e muito nervoso. O Vini não tinha nada a ver com aquilo. Não era justo ela me proibir de andar com ele. Mas, para minha sorte, aquela noite ela não tinha cheirado minha boca. Do contrário certamente sentiria o cheiro de cigarro.

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quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Aos Meus Amigos - 1 (Parte II)

(Não leu desde o inicio? Então aproveite em http://blagoiaba.blogspot.com.br/2013/09/aos-meus-amigos-introducao.html )

_ Que tá fazendo, Leo? – Perguntava o André pelo telefone.
_ Tô de boa em casa, assistindo televisão.
_ Dá um pulo aqui em casa. O Jonatan e eu compramos uma garrafa de Uísque.
E foi assim que deu inicio a noite do meu verdadeiro primeiro porre. Minha mãe havia ido jogar baralho na casa de uma amiga. Meu pai estava num churrasco com a turma do futebol e meu irmão tinha saído com seu amigo, o Borges. Minha irmã, pra variar, estava com o namorado. Era um sábado à noite, véspera de eleições municipais. Eu tinha dito aos meus pais que estava cansado e que não iria fazer nada, e a intenção realmente era essa, até ouvir o convite do André.
_ Opa! Já tô descendo.
Troquei de roupa, peguei a bicicleta e fui pra lá rapidinho. Coloquei calça e camiseta novas, pois, conhecendo os dois, certamente daríamos uma volta no centro depois, já que era sábado à noite.
Chegando lá o André e o Jonatan estavam sentados na área, tomando o uísque e jogando baralho. A tia Josefa não dava muita bola por bebermos, e geralmente ficava no seu quarto quando o tio Ernesto estava viajando a trabalho, mal saindo de lá.
_ Pega um copo na cozinha e trás mais gelo para nós. – Disse o André, e assim o fiz.
Enchemos os copos e acendemos cigarros, dando inicio a um jogo de caxeta.
_ Sua mãe não vai sair do quarto mesmo? – Quis ter certeza antes de pegar o cigarro para dar uma tragada.
_ Relaxa Leo. Há essa hora ela já está no décimo sono.
Pouco depois outra enchida de copos.
_ Será que a praça vai tá cheia hoje?
_ Sei lá. Depois da meia noite é lei seca, então acho que vai acabar cedo.
_ Opa! Bati seus imbecis.
E mais uma enchida e cigarros.
_ Vai lá pegar mais gelo, Jonatan.
_ Ok. Vou aproveitar e dar uma mijada. Caraio...!
_ Que foi?
_ Levantei e rodou tudo, hahahaha. Que massa.
E outra rodada...
_ Por que o Vini não veio?
_ Passei na casa dele e não tinha ninguém.
_ Porra! O gelo acabou de novo...
Tempo depois tínhamos matado a garrafa toda.
_ Vamos dar um pulo no centro?
_ Opa! Vamos ver umas gatinhas.
_ Caramba Jonatan! Tinha razão, foi só levantar que deu tontura.
_ A gente tava bebendo sentado. Aí nem percebe que tá ficando bêbado. Da hora, hahahaha.
E saímos os três, trançando as pernas, em direção ao centro onde estava o movimento.
Tudo parecia irreal: as pessoas davam a impressão de estarem mais alegres; as luzes deixavam rastros; os sons estavam mais lentos... não conseguíamos manter a atenção ou terminar um diálogo. Até que encontramos o Vini junto com o Silvinho.
_ E aí moçada. Parece que vocês já estão bem, hahahahaha. Que acha Silvinho?
_ Acho que já passaram do chamado “bem”. Que tá sentindo, André?
Quando o Jonatan e eu olhamos, o André estava pálido, com a cabeça baixa e mais molenga que o normal da bebedeira.
_ Tô passando mal. Acho que vou vomitar...
_ Caramba! Pra levar ele pra casa tá meio longe agora. – Disse o Vini. Então sugeri:
_ Vamos levar ele na minha casa. É aqui pertinho.
_ Mas sua mãe não vai ficar brava?
_ Não tem ninguém em casa a essa hora. E se o André dormir lá não tem problema.
E seguimos em direção à minha casa, de modo que o Jonatan e eu nos apoiávamos um no outro, enquanto o Vini e o Silvinho praticamente carregavam o André.
_ Chegamos. Esperem aí que eu vou pegar a chave. – Disse.
_ Pegar a chave? – Se espantou o Vini. – Mas você não disse que não tinha ninguém?
_ A gente deixa uma chave no armarinho aqui no fundo. Pera aí.
Entrei pelo portãozinho lateral, que ficava sempre aberto, me dirigi ao banheiro do fundo e peguei a chave no armarinho, voltando para frente e abrindo a porta.
_ Vamos levar ele no banheiro. Uma ducha gelada sempre ajuda. – Disse o Silvinho.
Tiramos as roupas do André, que já estava praticamente desmaiado, e o colocamos debaixo do chuveiro, deixando-o lá.
_ Acho que vou para a casa, Leo. – Disse o Jonatan, com ar de muito bêbado.
_ Você tá bem para isso?
_ Devo tá. Amanhã a gente se fala... – E saiu
_ Você tem café aí? – Quis saber o Vini. – Vou preparar um pouco pro André.
Mostrei onde tinha e ele começou a fazer, deixando uma bagunça na cozinha.
Tempo depois tiramos o André do chuveiro, demos café para ele e o colocamos para dormir num colchão na sala do fundo, onde eu costumava dormir aos fins de semana por ter televisão e ficar mais afastado dos outros quartos. Me despedi do Silvinho e do Vini, agradecendo, e resolvi dormir também, colocando outro colchão ao lado do que o André estava. Quando entro na sala ele estava vomitando um monte ao lado do colchão, sujando tudo, e quando acabou voltou a capotar de sono ou bebedeira.
_ André! André! Acorda pra limpar essa merda, porra! – Mas nada dele sequer abrir os olhos.
Chapado, peguei uma toalha de rosto e comecei a empurrar o vômito para baixo do sofá, me livrando momentaneamente daquele nojo. Feito isso decidi, enfim, deitar para dormir. Arrumei o colchão e o lençol e me deitei, mas tudo começou a rodar.
_ Que merda! – Pensei, e levantei para ir ao banheiro, com a ideia de forçar o vômito para ver se melhorava...

_ Leo! Leo! O que você bebeu? Responde moleque... – Perguntava meu pai enquanto me segurava debaixo do chuveiro gelado.
Meu pai e meu irmão chegaram praticamente juntos, e foram para o fundo ver como eu estava, já que havia dito que não iria sair. Com as luzes todas apagadas, meu pai tropeçou em algo macio e começou a dizer:
_ Sai Tobi! Sai! – Referindo-se ao cachorro que pensava estar no meio do caminho, mas o Tobi não saia, e então decidiu acender as luzes, me encontrando lá, caído de bêbado no meio do corredor.
_ Uísque... – Respondia debaixo do chuveiro, mal conseguindo falar.

Acordei pelado na cama, demorando para entender o que havia acontecido. Me troquei, acordei o André e descemos voando para o almoço na casa da vó Cotinha, onde fomos a sensação, tanto na bronca como na gozação:
_ Se aprontar outra dessa nunca mais sai de casa. – Falava minha mãe.
_ Todo mundo tem o primeiro porre, filha. – Defendia o vô Tonico.
_ Não criei meu filho pra isso. – Dizia o tio Ernesto, que havia chegado de viagem cedinho para votar.
_ Querem um golinho de caipirinha? – Oferecia o tio Mané, rindo ao ver nossa cara de nojo só de pensar em algo alcoólico.
E assim foi nosso domingo, sem poder sair da casa da vó Cotinha para nada, nos divertindo apenas enquanto contávamos para o Manezinho e o João da cagada que havíamos aprontado até a parte que nos lembrávamos. Mas risada mesmo demos quando encontramos o Jonatan, com o braço esquerdo todo ralado.
_ Eu só conseguia ficar em pé escorado no muro, mas devido à bebedeira eu ficava dando voltas no quarteirão. Ó o resultado, ó! Ralei todo o braço e nem senti na hora...

E foi só risada depois que tudo passou.