segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Aos Meus Amigos - 30 (Parte II)

(Não leu desde o inicio? Então aproveite em http://blagoiaba.blogspot.com.br/2013/09/aos-meus-amigos-introducao.html )


Pouco depois de prestar o único vestibular que me inscrevi chegou nossa formatura de terceiro colegial. Nossa porque o Neuza, o Hugo e o Mário eram da mesma turma que eu desde muitos anos. Nem precisa dizer que a turma toda estaria lá. O André não teria festa de formatura, apenas uma sessão de colação de grau que nem participaria, e o Helinho e o Antônio eram mais novos do que nós.
Quanto ao vestibular era um tanto obvio que eu tinha ido mal, não tendo nem chance de passar para a próxima fase, o que de certa forma foi um alívio tanto para mim como para os meus pais, pois assim teria um tempo a mais para me decidir o que queria de fato, sendo combinado que faria cursinho na cidade onde meu irmão estudava, e isso me deixava muito empolgado.
_ Mas se percebermos que não está levando os estudos a sério volta de imediato, entendeu? – Já tinha me repetido milhões de vezes minha mãe.
 Tínhamos grandes planos para a formatura. O Neuza, o Hugo, o Mário e eu havíamos pedido para nossos pais uma garrafa de uísque pela formatura, o que acabaram aceitando, rendendo quatro garrafas para nos deliciarmos. Claro que nessa conta entrariam outras pessoas de nossas famílias também, mas ainda assim julgávamos que daria para ficar bem alegre.
_ Formatura não costuma acabar tão tarde. O que faremos depois? – Quis saber o André.
_ Nunca fui na zona. Seria massa. – Comentou o Mário.
_ Tá aí uma boa ideia. Vai ser legar ir para a zona chapado depois da formatura. – Apoiou o Jonatan.
_ Quem sabe o Cleber não reencontra a Neuza, hahahahaha! – Soltei.
_ Verdade! Hahahahaha!
_ Vão se foder!
O Helinho e o Antônio ficaram empolgados também. Não eram mais virgens mas nunca tinham ido à zona. Não que tínhamos esse costume, mas já tínhamos ido vez ou outra por zoeira ou, no máximo, um show de strip-tease.
_ Combinado então. Acabando a formatura vamos todos zonear. – Sentenciou o Hugo.
_ Mas vai caber no carro do pai do Jonatan? – Perguntou o Antônio.
_ Se não couber nós apertamos. Não é tão longe. – Disse o Jonatan.
Estava tudo acertado.
O dia chegou, e com ele os preparativos. Meu irmão já estava em casa e feliz da vida ao saber das garrafas de uísque, mas eu não havia falado nada da zona. Minha irmã, o Roberto e o Neto também já estavam lá. O Neto usava um terninho em miniatura, o que chamava a atenção de todos. Ele estava se tornando um moleque bem bacana. Todos prontos e saímos em direção ao salão de formatura.
_ A mesa da família do Leonardo Félix é naquela direção.
Apontou uma moça que ajudava a organizar a cerimônia. Percebi que era perto da mesa da família do Mário, mas distante das do Hugo e do Neuza. A turma estaria um pouco dividida, já que havíamos dividido nossas cotas de convites com os amigos e ficariam um pouco em cada mesa. O André e o Helinho ficariam na minha mesa, o Jonatan na do Mário e o Antônio na do Neuza.
_ Que droga! E agora? – Perguntei.
_ Esquenta não, Leo. Ficaremos nas mesas só na hora de comer. – Respondeu o Hugo.
E foi bem isso.
Copos foram enchidos, conversas foram iniciadas e a diversão corria solto. Foi um saco a parte do cerimonial, mas valeu a pena pela alegria que meus pais ficaram, tendo até direito a uma valsa que dancei com minha mãe. Enquanto isso, o Antônio, o André, o Helinho e o Jonatan nos provocavam estendendo seus copos em nossa direção, pra varear. O Helinho se vingava do que fizemos a ele em sua formatura.
Terminando toda essa parte, serviram o jantar. Enfiamos um pouco de comida na boca sentados à mesa para que nossos pais nos deixassem em paz e já nos juntamos à turma. Estavam todos um pouco alegres já, e as garrafas já passavam da metade.
_ Tem umas gostosinhas na sua sala, heim? – Comentou meu irmão.
_ Até tem, mas são todas frescas. – Respondi.
As músicas se tornaram mais dançantes, o que levou todo mundo para a pista. O Roberto já estava bem chapado, e dançava no centro da roda fazendo graça com o Neto. Meu pai não se arriscava muito a dançar, preferindo ficar sentado mesmo, tomando hora cerveja, hora bicando o uísque. Já estava um tanto vermelho pela mistura.
Por volta das duas da manhã uma boa parte da família já tinha ido embora, incluindo meu irmão, que tinha saído com o Borges. As luzes já estavam acesas e o som permanecia baixo. Duas das garrafas estavam mortas, matávamos mais uma e apenas dois dedos da última resistiam, mas não por muito tempo.
_ Acho que tá na hora. – Falou o Jonatan.
_ Certeza!
Jogamos o resto do uísque num copo com gelo e fomos em direção ao carro.
Estávamos em oito, e o carro era pequeno. Tínhamos que dar um jeito.
_ Alguém vai na frente comigo no banco do passageiro, quatro se apertam no banco de trás e um vai no porta malas. – Sugeriu o André.
Nos olhamos.
_ Vou com o André no banco da frente! – Me apressei.
_ Que bosta! – Falou o Hugo. – Vamos tirar a sorte para ver quem vai no porta malas.
_ Pode deixar que eu vou. – Se ofereceu o Antônio.
O Porta malas não era desses que fica aberto ligado ao banco de passageiros, sendo totalmente fechado. O Jonatan o abriu e o Antônio foi se enfiando lá. Cheirava a graxa.
_ Espero que não suje minha roupa. E vê se vai devagar, heim Jonatan?
_ Hahahaha! Pode deixar.
Nos apertamos todos da forma combinada e seguimos em direção à zona, tendo que cruzar uma parte da cidade e atravessar a pista, pegando um pequeno trecho de terra. Não era a mesma que o Neuza tinha ganhado o apelido, sendo uma considerada um pouco melhor.
_ Vamos por aquela rua. Tem mais lombadas nela. – Disse o André.
_ Certeza. – O Jonatan concordou.
A cada passada por lombada, ouvíamos do porta malas:
_ PORRA!!! VAI DEVAGAR NESSA MERDA!!!
E dávamos risadas.
Paramos em frente ao portão do estabelecimento. Um sujeito fazia a função de porteiro.
_ São maiores de idade?
_ Somos sim.
_ Tem algum documento?
O Jonatan mostrou o dele, e só o dele, único maior de idade. Foi o suficiente para nos deixar entrar. Paramos no estacionamento e começamos a sair. Percebíamos olhares crescendo conforme saiam sete pessoas de dentro de um carro compacto. Além dos olhares, um certo cochicho ao abrir o porta malas e sair mais um indivíduo.
_ Seus viados. Se ficar com os braços roxos vocês vão ver só!!! – Se revoltava o Antônio.
Nos dirigimos para dentro, onde uma luz vermelha pouco iluminava o local e garotas e uns pouco clientes nos olhavam. Como estávamos de terno e gravata, despertava mais as atenções. Uma mulher de idade já um pouco avançada se aproximou, e o André tomou as palavras.
_ O que vai ser para os senhores?
_ Queremos um strip completo com a mais gostosa.
A mulher chamou algumas das garotas e começamos a escolher, nos decidindo sobre uma delas. Era bem gata e gostosa.
_ Quanto é?
E ela nos falou o preço. O André nos puxou para um canto para conferirmos o dinheiro. Tiramos nossas carteiras do bolso e passamos a contar cada nota e moeda. Faltava uma quantia. O André tentou negociar.
Vendo o balançar de cabeça negativo feito pela mulher a cada frase do André, o Neuza tirou uma caneta do bolso e se aproximou dos dois. Também nos aproximamos, curiosos com o que ele faria.
_ Com licença? Sei que não temos todo o dinheiro, mas e se eu deixar essa caneta no lugar para completar? Eu a ganhei do meu pai pela minha formatura, e é um presente que certamente vou querer levar por toda a vida. Eu a deixo com a senhora e, amanhã à tarde, lhe trago a quantia que falta do dinheiro para pegar esta caneta de volta. O que me diz?
A mulher olhava para ele e para a caneta em sua mão. Realmente era uma caneta bonita, e ficamos confusos com a história.
_ Não precisa disso não, Cleber! – Disse para ele.
_ Pode ficar tranquilo, Leo. Não vou querer perder essa caneta por nada. Amanhã eu volto para pegá-la de volta.
A mulher pegou a caneta e deu uma longa olhada para ela. Suspirou e chamou a garota.
_ Pode se preparar. Esses senhores querem um strip-tease completo.
E nos conduziu para a salinha com um pequeno palco. Pouco tempo depois, uma música sensual teve início, junto com um fajuto jogo de luzes. A garota entrou, com a mesma roupa que estava mas portado um pequeno chicote de acessório. Dançava e rebolava ao som da música, fazendo caras de uma atriz amadora tentando ser sexy. Tudo muito artificial, mas àquela altura do campeonato estávamos delirando.
_ Tira a roupa logo!!! – Gritava o Hugo.
_ Rebola mais!!! – Berrava o Neuza.
_ Gostosa!!! – Se empolgava o Mário.
O Helinho e o Antônio estavam pirando também. A coisa estava esquentando.
A mulher desabotoou a apertada calça que estava e começou a baixa-la de pouco em pouco, até tirá-la totalmente com certo esforço. Já devia ter feito isso várias vezes, mas não impediu de se desequilibrar na hora de passar a calça pelos pés com o salto alto. Jogou a calça para o lado e se virou de costas para nós, mostrando sua bunda. Os ânimos caíram.
_ Que bunda murcha?!? – Comentou o Antônio numa altura que ela não ouviria.
_ Pois é. Que merda! – Concordou o Jonatan
_ De calça tava melhor. – Falei.
Ela continuou. Começou a desabotoar a blusa. Logo veríamos os peitos, que pareciam fartos.
_ Que merda! – Disse mais uma vez o Jonatan, dessa vez mais alto um pouco.
Eram umas merdinhas de peitos, e já um tanto caídos. O sutiã tinha enchimento.
O gritos de animação tinham cessado. Começamos a só curtir o momento e a furada na qual tínhamos nos metido. Passamos a nos divertir com as poses e expressões que ela forçava, mas já sem tesão nenhum.
_ É isso aí! Rebola mais!
E ela se chacoalhava exageradamente.
_ Faz cara de puta!
E ela abria a boca e simulava sexo oral com o próprio dedo.
_ Fica de quatro!
E ela obedecia, se sentindo toda.
Quinze minutos depois acabava a música. Ela recolheu suas roupas, ainda nua, e saiu do palco, enviando beijinhos em nossa direção.
_ Que bosta, heim? – Disse o Neuza.
_ Mas foi divertido. – Falei.
_ Isso foi. - Concordou o Mário.
Ao sairmos da salinha a mesma mulher com quem negociamos se aproximou:
_ E então? Ninguém vai querer conhece-la mais de perto?
_ Valeu, dona. Não tínhamos nem todo o dinheiro do strip imagina para o sexo. – Soltou o André.
Ela ficou um tempo pensativa.
_ Mas você vem buscar a caneta, não vem? – Perguntou ao Neuza.
_ Mas é claro, minha senhora. Essa caneta tem grande significado para mim.
E fomos saindo, com ela nos acompanhando com os olhos enquanto nos apertávamos no carro e o Antônio se enfiava no porta malas praguejando coisas para que o Jonatan desviasse de lombadas.
_ Neuza? – Perguntei logo que deixamos o portão para trás. – Loucura essa história da caneta. E se ela não te devolver mais ou pedir mais caro?
_ Leo, aquela caneta peguei do balcão do bar da formatura. Eu ia devolver, mas depois esqueci.
Um breve silêncio. Bem breve mesmo até todos caírem na risada.
Do porta malas só ouvíamos uns berros:
_ DO QUE VOCÊS ESTÃO RINDO? ME CONTA! QUERO SABER!!!
E terminamos a noite no trailer de lanches, tomando algumas cervejas e matando uns cigarros.

Foi bem divertido.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Aos Meus Amigos - 29 (Parte II)

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_ Administração – Falei.
_ Tem certeza, Leo? É isso que você quer? – Perguntou meu pai.
_ Acho que sim.
_ Você acha! Leo, você está escolhendo um curso que lhe dará o rumo para uma vida inteira. Não pode ficar num “acho que sim”! – Foi a vez da minha mãe falar.
_ Mas eu não sei ao certo o que fazer. Deram umas palestras na escola e administração foi o que achei um pouco mais legal. Não sei.
Sentia pânico vindo dos meus pais. Não que eles não achassem que administração fosse um bom curso, mas eles não viam tal perfil e disposição em mim. Eu mesmo não sabia ao certo, tendo escolhido esse curso mais para me deixarem em paz.
_ Certo. – Tentava se acalmar meu pai. – E você já viu onde vai prestar e tudo mais?
_ Meus amigos vão prestar a estadual. Vou com eles.
_ E o que mais? – Minha mãe perguntou.
_ Só ela, acho.
_ Você tem que tentar em outros lugares, filho. Pra ter mais chance. Tem as federais também, assim como outras estaduais.
_ Tá. Vou pensar nisso certinho. Tô saindo. Tchau.
E assim se dava mais uma fuga. Sentia que isso não acabaria nunca.

_ Então seus pais não se convenceram, Leo?
Comentou o Hugo depois que lhe disse da conversa com meus pais. O duro é que o Hugo já sabia o que queria, só estava em dúvida de onde prestar.
_ Pois é. Tô ferrado. Nem sei o que quero da vida.
_ Eu escolhi programação por ser uma carreira do futuro. Qualquer lugar que você vai se usa computador hoje em dia, e um primo meu tá fazendo isso e me mostrou um pouco. Achei bem legal e decidi seguir também. Você precisa achar algo que você gosta.
_ É...
A não ser por mim e pelo André, todos já sabiam o que fazer: o Mário queria medicina, o Neuza comunicação, o Jonatan já fazia computação, o Helinho dizia que queria fazer farmácia e o Antônio jornalismo. Pra piorar, o André já sabia o que queria para o próximo ano, apesar de não saber o curso que faria. Ele iria para a capital do estado morar com o Rodolfo, seu irmão, e fazer cursinho. Depois decidiria o curso de fato. Só eu estava totalmente perdido.
_ Administração não deve ser tão ruim assim... – Tentava me convencer da escolha.
Seguimos até a casa do André. O bar do Pescocinho já estava ficando enjoativo, e cada vez mais ia um bando de moleques folgados que falavam alto demais e mexiam com todo mundo. O jogo de tiro do Antônio era legal, mas a disputa ficava só entre ele e o André. Decidimos nos reunir para ver o que fazer naquela sexta. Os sábados não eram problema, já que sempre íamos à boate, mas as sextas sempre se mostravam um desafio.
_ Que vai rolar hoje? – Perguntou o Neuza.
Fumávamos um cigarro na calçada, já sem medo da tia Josefa que nunca saia do quarto quando o tio Ernesto estava viajando. Bicávamos uma garrafa de conhaque com refrigerante.
_ Dar um rolê na praça? – Sugeriu o Mário.
_ Nem. Só tem molecada. E umas meninas frescas de doer. – Disse o André.
O Jonatan estava na faculdade, ou em algum barzinho, como era de costume fazer as sextas na cidade onde estudava. Ficávamos com inveja só de imaginar.
_ Jogo de tabuleiro? – Disse o Hugo.
_ Já enjoamos. – Falou o Antônio, que nem tinha jogado tanto assim conosco mas já estava de saco cheio também.
_ Quando éramos crianças qualquer brincadeira de esconde-esconde já era uma alegria. Agora tudo enche o saco. – Foi a vez do Helinho se expressar.
_ É isso! – Soltei.
_ É isso o que? Perguntou o André.
_ Vamos brincar de esconde-esconde. Quando éramos pequenos já era legal, e tínhamos todas as limitações devido à idade. Mas agora, vai ser bem mais legal. Que acham?
Silêncio. Estavam todos pensativos, e cada vez mais se via um sorriso crescente no canto de cada lábio.
_ Pode ser legal.
_ É! Também acho.
_ Eu topo!
_ Eu também!
O André já se levantou e pegou uma pedra do chão, anunciando de prontidão:
_ Rei da pedrinha chiqueirinho livre!
_ Babaca! – Alguém soltou.
E formamos uma fila em frente a ele, como não fazíamos há muitos anos.
O André colocava as mãos para trás e escolhia uma delas para colocar a pedrinha sem que ninguém visse, deixando a outra livre. Logo depois estendia as duas para que o primeiro da fila batesse em uma delas. Escolhida a mão da pedra era um possível candidato ao pique. Mão sem pedra estaria livre.
_ Helinho Livre.
_ Hugo não. Espera do lado direito.
_ Neuza também não. Lado direito.
_ Mário livre.
_ Leo livre.
_ Antônio lado direito. Faz fila de novo Antônio, Hugo e Neuza.
Pouco depois, Hugo era o escolhido, devendo contar até cem para que todos nos escondêssemos. Parecíamos realmente crianças com a animação.
_ 1, 2, 3, 4, 5...
_ Você que conhece as redondezas, onde tem lugar legal, Leo? – Perguntou o Antônio.
_ Se quiser me siga.
O Neuza e o Helinho correram para a casa velha do outro lado da rua, pulando o muro baixo e se embrenhando no mato ao fundo. O Mário seguiu o André, que começou a subir em uma árvore no meio do quarteirão, com copa bem larga, de modo que a sombra os escondia bem. O Mário tinha certa dificuldade em subir, mas conseguiu. Fui com o Antônio até a esquina, de modo a me encostar no muro assim que viramos.
_ Acho que aqui é ruim, Leo. Tá muito longe do pique. Teríamos que ganhar na corrida qualquer coisa.
_ Fica calmo. Não sei como o André não veio pra cá também? Fazíamos esse plano direto quando éramos crianças.
Subi no muro da casa da esquina. Tudo apagado. Fazia muitos anos que ninguém morava ali. O Antônio me seguiu. Pulamos no quintal e, de lá, seguimos para o próximo muro, de uma casa com gente. Sussurrei ao Antônio:
_ Aqui que temos que tomar cuidado, pois os moradores podem perceber a gente. Toma cuidado.
Circulamos a casa nos equilibrando por cima dos muros, dando a volta pelos fundos. Estávamos preocupados de ter algum cachorro, mas nada. A próxima etapa era o fundo de uma oficina, onde não havia ninguém e sabíamos que não tinha nenhum cachorro. Quantas vezes não bombardeamos os portões daquela oficina chutando bola há anos atrás? O passo seguinte já era o telhado da casa do André, onde nos dava uma bela vista do pique e da posição do Hugo, permitindo descer em tempo para nos salvar. Apesar de não sermos mais crianças com todo o pique e folego que elas têm, agora tínhamos mais força e agilidade.
Durante todo o percurso ouvimos os berros e as correrias da molecada. O Neuza já tinha sido pego, mas o Helinho tinha corrido mais rápido que o Hugo e se salvado. O Mário e o André ainda não haviam sido descobertos, mas o Hugo já desconfiava das árvores, rodeando-as sem se afastar muito da região do pique.
_ Caralho! Uma maria-fedida!
Ouvimos o Mário, seguido de uma barulheira dele descendo às pressas da árvore.
_ Tá pego, Mário! – Gritou o Hugo, batendo no pique.
Mais barulho da mesma árvore. O André segurava o riso, mas não dava pra saber que era ele.
_ Quem tá aí? – Gritava o Hugo.
Confiante de que pegaria mais alguém, o Hugo se afastou do pique em direção à árvore. Foi nossa deixa.
_ Vem, Antônio! É agora!
Descemos rapidamente do telhado pelo muro, sem qualquer dificuldade. Eu já tinha feito aquilo milhões de vezes, e o Antônio acompanhou bem.
_ Leonardo salvo!
_ Antônio Salvo!
O Hugo se virou, com ar de irritação. Foi a vez do André se aproveitar da distração: Estando preparado para uma eventual corrida, o André havia se posicionado numa das pontas da árvore, e, numa manobra muito parecida com a que fazíamos na mangueira do terreno do circo, se pendurou num galho e caiu mais à frente do Hugo, partindo em disparada.
A disputa procedia, com gritos da molecada, mas não teve jeito para o Hugo e o André se salvou.
_ Hahahaha! Se fodeu! – Gritava o André.
_ Quem se fodeu foram o Mário e o Neuza. Não eu. – Se defendia o Hugo.
_ É verdade. Tirem par ou impar para vez quem bate cara. – Falei.
_ Tio? A rua aqui é mão única, né? – Perguntou o Helinho.
_ É, por quê?
_ Tem um burro subindo a rua na contra mão e com o farol apagado.
Ficamos olhando o carro sem noção, até que, a poucos metros de nós, duas luzes fortes se acendem junto com os faróis, também fortes. Barulho de sirene. Era a Polícia.
_ Mãos na cabeça e encostados no muro, molecada! AGORA!
_ Calma aí... – Tentou argumentar o Antônio.
_ AGORA, PORRA!!!
Obedecemos.
Dois policiais desceram do carro, um com uma arma e uma lanterna apontadas para a gente e o outro vindo em nossa direção para revistar. O Neuza tentou olhar para um deles e já foi tomando um empurrão com as mãos do policial para que voltasse a cabeça para a parede. Ninguém se arriscou falar nada.
_ Tudo limpo. – Informou o guarda da revista.
Vizinhos começaram a apontar suas cabeças por muros e janelas. A tia Josefa saiu às pressas.
_ O que está acontecendo aqui?!? – Dizia, desesperada, ao ver seu filho e neto de encontro à parede.
_ Perturbação da ordem e possibilidade de furto, senhora. Já enquadramos os suspeitos.
_ Mas são meu filho, meu neto e os amigos deles! Meu sobrinho está aí também!
Os policiais se sentiram perdidos.
_ Recebemos telefonemas de barulhos e correrias na rua. Um dos vizinhos disse que andavam por sobre os muros e telhados das casas.
Começamos a nos virar devagar. Foi o Helinho quem se arriscou:
_ Estávamos brincando de esconde-esconde.
_ Esconde-esconde? Nessa idade? – Se espantou um policial.
_ É. Não tinha nada pra fazer achamos que seria divertido. – Completei.
Os policiais relaxaram um pouco. Os vizinhos foram perdendo o interesse pela situação.
_ Jovens, entendo que nossa cidade não tem muito a oferecer, mas vocês têm que entender também que assustaram os vizinhos com os barulhos e a correria. Não é todo dia que pessoas na idade de vocês fazem isso. Procurem outra coisa para fazer.
Concordamos com a cabeça e eles foram embora. A tia Josefa também pediu mais cuidado e entrou. Acendemos cigarros.
_ Tentamos brincar de modo inocente e não deu. – Disse o Mário.
_ O jeito é beber mesmo. – Acrescentou o Hugo.
_ Vamos para o Pescocinho então. – Convocou o André.

E assim seguimos para mais uma sexta regada a cerveja, cigarro, fliperama e bilhar. Fazer o que?

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Aos Meus Amigos - 28 (Parte II)

(Não leu desde o inicio? Então aproveite em http://blagoiaba.blogspot.com.br/2013/09/aos-meus-amigos-introducao.html )


O ano corria rápido, e era o último de escola. Logo chegariam os vestibulares e eu ainda não tinha ideia do que realmente queria, só sabia que era na área de humanas. Meus pais já se preocupavam com isso:
_ Você tem que escolher algo, Leo! – Dizia meu pai.
_ Não é possível que não tenha nenhum curso que você se identifique! – Falava minha mãe.
Minhas notas nunca tinham sido lá grande coisa e vivia ficando de recuperação de uma matéria ou outra. Sabia da importância da faculdade, mas não conseguia me decidir. E ficava quieto, só me desviando da discussão cada vez que tocavam nesse assunto. Percebia o olhar de preocupação nos olhos dos meus pais.
_ Tá! Vou pensar melhor nisso. Vou sair com meus amigos e depois falo o que decidi.
E fugia mais uma vez...
O Antônio tinha ganhado um vídeo game novo e nos chamado para jogar. A turma toda estava lá: Jonatan, que tinha faltado da faculdade naquela sexta-feira, André, Mário, Hugo, Neuza, Helinho e eu. A novidade era um jogo de tiro em que se usava uma pistola para mirar na tela e atirar ao invés de usar o controle convencional. Fazíamos pequenas competições um contra o outro eliminando os piores até chegar a um vencedor. Estava muito divertido.
_ Antônio, vou jantar com a roda de amigas e só volto mais tarde. Tem pizza e refrigerante na geladeira. Divirtam-se, mas tenham juízo. – E assim saia a Dona Dirce, nos deixando sozinhos.
_ Que massa. Vamos comprar bebidas. – Falei.
_ E tem pizza mesmo? – Perguntou o Neuza.
_ Tem sim. Dá pra todo mundo. E esperem aqui.
O Antônio saiu e voltou logo em seguida, com um sorriso no rosto:
_ Não precisaremos comprar bebida hoje.
Em sua mão uma garrafa de vodca importada. Não acreditávamos naquilo.
_ Onde você arrumou isso? – Queria saber o Jonatan.
_ Minha vó ganhou faz tempo de uma amiga dela. Acho que dá pra gente, não?
_ Opa se dá. Mas sua vó não vai sentir falta? – Foi a vez do André indagar.
_ Pode ficar tranquilo que eu pedi pra ela. Falou que se a gente não beber ninguém vai beber mesmo.
_ Sua vó é foda Antônio! – Vibrou o Hugo.
O Helinho ajudou o Antônio a trazer os copos, todos pequenos, como havia pedido o André, dizendo que tinha tido uma ideia. Vindo dele, sabíamos que a diversão seria garantida.
_ Cada um toma uma dose pura, virando. Aí começamos a competição no jogo de tiro. Vai ser massa mirar bêbado. Conforme perde tem que virar outra dose. O que acham?
_ Vixi! Isso não vai prestar, mas tô dentro. – Anunciei.
E todos toparam na primeira...

_ Hahahahaha!!! Acertou o pato e perdeu dez mil pontos. Que burro! – Aloprava o Hugo enquanto o Neuza jogava.
_ Bosta!!!
_ Vai ter que virar novamente, Neuza. – Estendia o copo o Helinho.
_ Nooooossa!!! Já tô bem louco!!! – Disse o Neuza depois de virar.
Já tinha ido meia garrafa. O Mário, o Neuza e eu éramos os mais chapados por sermos ruins no tal do jogo. Os campeões até agora eram o Antônio e o André, que acabavam bebendo mais por vontade própria do que por perderem. A disputa tava dura.
_ Quero ver me passar agora, Antônio. Acertei a estrela menor.
_ Seu viciado! Se eu conseguir o tiro duplo você tá ferrado.
E lá estava o Antônio virando um copo. O Helinho já dormia no sofá, chapado. Saímos para um cigarro nos fundos.
_ Hoje tá massa. Foi bom sair um pouco do bar do Pescocinho. – Disse o Jonatan.
_ Foi mesmo. E ainda bem que a vó do Antônio é de boa. – Falou o Hugo.
_ E se é. E esse jogo é massa, mas ninguém ganha de mim. – Cantou vitória o André.
_ Teu cu. Você tá só três pontos na minha frente. Nessa rodada te passo. – Se defendeu o Antônio.
_ Cara, eu já tô bem chapado. – Falei.
Ouvimos barulho de carro chegando. Era a vó do Antônio.
_ Escondam os cigarros, galera! – Pediu com certo desespero o Antônio, que apesar de não fumar de fato hora ou outra pedia uma tragada a alguém.
Chegando na sala a molecada escondia os copos e a garrafa de vodca.
_ Boa noite! Parece que estão meio bêbados? Não adianta esconder os copos que eu estou vendo, viu? – Falou a Dona Dirce.
Ninguém ousou falar nada, cabendo ao Antônio romper o silêncio:
_ Eles são muito fracos, vó. Não tão aguentando uma garrafa de vodca.
_ Seus frouxos. Na minha época de adolescente eu derrubaria cada um de vocês na bebida. Estou indo para o quarto, Antônio. Só não façam muito barulho.
_ Ok vó.
Não acreditávamos naquilo. Se fosse em casa, além de mandar todo mundo embora no ato, certamente uma cena como essa me renderia ao menos uma semana de castigo.
_ Vamos para mais uma rodada então! – Chamou o André, e todos se animaram mais ainda.

_ Valeu Antônio. Amanhã a gente se vê. – Me despedia.
Àquela altura o André já tinha ido embora pra levar o sobrinho bêbado que dormia no sofá. O Cleber e o Mário também já tinham ido e restava apenas o Hugo, o Jonatan e eu.
_ Aquela pizza foi massa, mas eu ainda encarava um lanche. – Disse o Hugo.
_ Tô dentro. Vai ajudar a sarar um pouco a bebedeira antes de ir para casa. – Falei.
_ Na barraquinha da praça mesmo? Vou indo de mobilete e encontro vocês lá.
_ Dá uma carona aí, Jonatan?
_ Vai andando com o Hugo, Leo. Tá aqui perto.
_ Babaca.
E acendi um cigarro e fui com o Hugo rumo à praça, que ficava a pouco mais de cinco quadras.
_ A noite foi massa.
_ E se foi. O Antônio e a vó dele são da hora.
_ Esse jogo é legal, mas não peguei o jeito.
_ Nem eu. Nossa! Bebi pra caramba. Vodca pura é foda, hahahahaha!
Chegamos ao lanche e os pedimos, acendendo mais um cigarro enquanto esperávamos. Começamos a perceber que estávamos mais bêbados do que imaginávamos.
_ Vou levar meu lanche pra comer em casa. – Disse o Hugo, se levantando pra pedir pra embrulhar seu lanche.
_ Vai comer aqui. Jonatan? – Perguntei.
_ Acho que sim.
O Hugo pegou seu lanche, se despediu e foi embora. Jonatan e eu comíamos nossos lanches, com certa voracidade. Minutos depois, novos cigarros pós lanche.
_ Bem, é isso Leo. Já vou indo.
_ Me dá uma carona até em casa?
_ Puta, Leo. Sua casa é lá encima. A minha é do outro lado. Tô bem cansado.
_É rapidinho.
_ Fica pra próxima. Tô caindo de sono. Juro que na próxima te levo.
O Jonatan levantou e foi para a mobilete. A ligou e começou a sair. Nisso me levantei e comecei a correr atrás da mobilete dele.
_ Espera aí! É só uma carona!
O Jonatan, ainda pegando embalo, olhou para trás e me viu se aproximando.
_ Que tá fazendo, Leo!!!
E pulei na traseira da mobilete em movimento, me sentando atrás do Jonatan.
_ PORRA, LEO!!!
O Jonatan perdeu o equilíbrio com a tranco da minha sentada e começou a tentar manter a direção movendo o guidão, mas inutilmente. O pneu da frente batei na sarjeta e fomos os dois para o chão, mal vendo o movimento da queda.
_ Caralho, Jonatan! Não sabe dirigir não?
_ PORRA, LEO!!! PORRA, LEO!!! PORRA LEO!!! – Não parava de gritar o Jonatan.
Quando olhei, ele estava com a mão na boca, e ao tirá-la, sangue escorria próximo ao nariz.
_ Olha o que você fez!!!
Olhava para ele e para a mobilete, com o pneu da frente e lanterna arruinados, e voltei meus olhos para ele.
_ Porra, Leo! – Disse, com a voz mais calma mas um desespero maior. – Quebrou meu dente!
E abriu a boca mostrando o dente da frente faltando um pedaço. Não sabia o que fazer.
_ Calma, Jonatan. Eu pago os concertos. – Foi tudo o que consegui dizer.
O ajudei a levar a mobilete para casa e depois segui para minha, já sem qualquer sinal de bebedeira e a altas horas da madrugada. Ao abrir a porta de casa, minha mãe me esperava.
_ Já tá um pouco tarde para uma sexta-feira, não tá não?
Olhei para ela e meus olhos se encheram de lágrimas.
_ Que aconteceu, filho?
_ Fiz cagada, mãe. Fiz cagada.

E lhe contei o ocorrido, rendendo uma bela bronca e o fim de semana de castigo...