sábado, 19 de setembro de 2015

Aos Meus Amigos - 33 (Parte II)

(Não leu desde o inicio? Então aproveite em http://blagoiaba.blogspot.com.br/2013/09/aos-meus-amigos-introducao.html )


_ Mas já vai sair, Leo? Nem vai ficar um pouco com a gente? – Reclamava minha mãe.
Eu havia chegado a pouco mais de uma hora. Malas desfeitas, ligações realizadas, encontro na casa da vó do Antônio marcado. A turma toda já estava na cidade, de modo que eu tinha sido o último a chegar. Meu irmão já tinha saído para encontrar o Borges, também sob protestos da minha mãe, mas ela não esperava que eu fizesse o mesmo.
_ Deixa ele, querida. Tá com saudade dos amigos. – Disse meu pai, sentado numa poltrona que haviam comprado para que pudesse ficar mais confortável enquanto recuperava de sua doença.
Ele estava mais magro e um tanto pálido. Claro que fiquei preocupado e conversei um tempo com ele, mas insistia em dizer que não era nada de mais e que estava bem. Acreditei, afinal, era meu pai.
_ Amanhã passamos o dia juntos. Pode deixar. Tchau!
E saí às pressas na minha velha bicicleta. Não via a hora de encontrar os amigos.

_ Que isso, Leo? Deixando o cabelo crescer também? – Disse o Jonatan, estranhando meu novo visual. – Vai ficar igual seu irmão daqui a pouco, hahahaha.
_ Vai se foder, Jonatan! – Disse, dando um forte abraço nele.
_ Olha o que está te esperando! – Se aproximou o Antônio com um copo de cerveja.
_ Aí sim! Hahahaha.
Virei o copo e foi a vez de abraça-lo.
Dessa forma fui cumprimentando um a um, de modo que fazíamos comentários sobre o que havia mudado em cada um de nós nesses poucos meses que não nos vimos: O Jonatan estava mais gordo e havia parado de fumar, o que estranhamos, mas ele dizia que estava ficando sem fôlego para qualquer coisa, indo ao médico que o aconselhou deixar o vício. Disse que não estava fácil ficar sem o cigarro mas que estava disposto a parar mesmo; o André, ao contrário, tinha emagrecido e estava um tanto pálido, dizendo que a correria na cidade grande era uma bosta e que pensava muito em voltar. Ficou fazendo comparações das diferenças de cada lugar, salientando sempre a questão do tempo, pois na capital, pra ir da casa do irmão até o cursinho, demorava quase duas horas; o Hugo parecia um nerd, com uma camiseta de faculdade com computadores desenhados e a frase: Eu faço programas. Tinha começado a namorar uma garota de lá e, como ela fumava, ele também tinha começado; o Neuza estava barbudo e começara a usar óculos. Disse que estava legal a faculdade, apesar dos caras com quem morava serem uns babacas e que pensava em morar sozinho; o Mário, o Hélinho e o Antônio que não tinham mudado nada, talvez pelo fato de continuarem a morar em suas casas. Parecia que todos se ajeitavam de alguma forma.
_ E decidiu que curso fazer, Leo? – Perguntou o Hugo, tragando um cigarro.
_ Mais ou menos. – Respondi, ainda estranhando vendo-o fumar.
_ Como assim mais ou menos? – Foi a vez do Helinho perguntar.
_ Tô gostando muito de uma matéria do cursinho, e estou pensando em fazer faculdade dela.
_ Que matéria? – Agora foi o Antônio.
_ Filosofia.
Silêncio. Pareciam não acreditar.
_ Quê?!? – Quebrou o silêncio o Neuza.
_ O que é que tem?
_ Leo, na minha faculdade tem curso de filosofia, e os caras são todos loucos. Ficam fumando maconha o dia inteiro e viajando na maionese. – Explicou seu espanto o Neuza.
_ Na faculdade do meu irmão também tem filosofia. Fui a uma ou outra palestra do curso, e tenho achado bem legal. Os alunos são meio porra loucas mesmo, mas o curso é da hora. E você André? Já pensou em algo? – Tentei me tirar do centro das atenções.
_ Acho que sim. Tô pensando em fazer odonto.
_ É uma área legal. – Falou o Mário.
_ Vi que quero ir pra área da saúde. Até pensei em enfermagem, mas acho que odonto vai ser mais legal.
_ E vai voltar pra cá mesmo? – Quis saber o Jonatan.
_ Vou sim. Terminando o semestre já volto. Isso está decidido.
E continuamos com os papos, cervejas e cigarros. A vó do Antônio não estava lá, o que nos deixou mais à vontade. A noite planejávamos matar a saudade da boate. Era realmente muito bom reencontrar os amigos.

_ Leo! Leo! – Chamava minha mãe. – Acorda filho! Temos que ir almoçar na casa da Rosália. Já está tudo pronto.
_ Tá...
E comecei a levantar, com uma baita dor de cabeça de ressaca. Mal lembrava como havia chegado em casa. Fazia tempo que não bebia daquele jeito. Mas tinha sido massa sair com a molecada.
_ Nossa, Leo! Como você tá diferente! – Disse a Rosália, me abraçando.
_ Vai falar que você também está gostando das mesmas músicas que seu irmão? – Perguntou o Roberto.
_ Rock é vida. – Respondi, abraçando-o.
_ Esse mundo tá perdido... – Brincou ele.
Meu irmão só deu um pequeno sorriso, gostando das minhas palavras.
_ Cadê o Neto?
_ Filho! Vem cá! Seus tios chegaram!
E veio aquele moleque encapetado correndo. Estava enorme. Peguei-o no colo e comecei a jogar para cima, ao som de suas gargalhadas. Estava com quatro anos já.
_ Agora é minha vez! – Já foi pegando-o o Lourenço.
Aperta o moleque daqui; faz cocegas dali; tentativas vãs de fuga e...
_ Buáááááá!!! Quero sair!!!
_ Ah! Seu chorão.
E corre o Neto para os braços da sua mãe.
Almoço servido. Todos à mesa. O Roberto abriu uma garrafa de cerveja e colocou um copo para mim. Minha mãe só olhou mas nada disse. Gostei daquilo.
_ Não vai beber, pai? – Perguntei, estranhando o copo com refrigerante à sua frente.
_ Seu pai tá tomando remédios, Leo. Não pode beber. – Disse minha mãe.
Meu pai só ficou quieto. Percebi que estava triste. Cerveja sempre foi algo que ele gostou muito. Então comecei a reparar que ele estava mais quieto que de costume. Aquilo me preocupou.
Depois do almoço passamos na casa de alguns parentes que há tempos não via: Vô Joaquim e vó Ofélia, que estavam velhinhos mas bem ainda; Tia Matilde, que morava com um namorado, seu Viana, numa casinha pequena; Tio Mané, que estava bem, embora um tanto sozinho, uma vez que o João morava longe e o Manezinho tinha se amigado com uma garota que não era a mãe de seu filho; Por fim, pedi que deixassem a tia Josefa por último, pois de lá já me encontraria com o André para nos juntarmos à turma. O Helinho também estava lá.
Nos encontramos, pra variar, na casa da vó do Antônio, e de lá decidimos ir ao bar do Pescocinho jogar bilhar. O Neuza ficou dizendo que daria uma surra em todos, uma vez que tinha uma mesa na faculdade e que estava jogando muito. Eu, ao contrário, não tinha jogado desde que fui morar com meu irmão. Chegando lá, estranhamos o local: o bar tinha sido reformado, tendo novo balcão, novas mesas e cadeiras, sem os fliperamas e apenas uma mesa de bilhar, maior e com pano vermelho. O Pescocinho não estava atrás do balcão, e sim um rapaz bem mais novo.
_ O Pescocinho não está? – Perguntou o Hugo.
_ Pescocinho? – Disse o cara. – Ah! O antigo dono? Se aposentou. A família o encontrou desmaiado no bar um dia desses de tanto beber e decidiram que ele deveria vender o bar. Ai eu o comprei e dei um trato. Ficou bem melhor, não acham?
Ficamos um tempo quietos.
_ E quanto tá a ficha do bilhar? – Quis saber o André.
_ Não é ficha não. Vocês pagam por hora. E essa mesa é show.
E nos disse o valor.
Ficamos um tempo quietos novamente.
_ E então? Quantas horas vão jogar?
Sem nem precisar perguntar para os outros, o Mário já deu a resposta que queríamos:
_ Nenhuma não. Muito caro. Valeu.
E saímos, ficando perdidos de onde ir.
_ Vocês não sabiam do Pescocinho? – Perguntei ao Helinho e o Antônio.
_ Não. A gente não veio mais aqui. Sem vocês não é a mesma coisa. – Respondeu o Helinho.
_ Bem, vamos ter que achar outro boteco...
E saímos andando, meio que sem rumo, até voltarmos para a casa da vó do Antônio.

Só ficar longe alguns meses e muita coisa havia mudado. Pelo menos estava com os amigos. E ainda tinha aquela noite e o sábado todo junto deles. O jeito era aproveitar.

sexta-feira, 27 de março de 2015

Aos Meus Amigos - 32 (Parte II)

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Morar na cidade que meu irmão estudava estava legal, mas bem diferente do que eu achava que seria. O ritmo de festas e baladas prometidos quando eu cheguei não era exatamente daquela forma, pois nossos horários e compromissos nunca batiam. O Lourenço, o Rodrigo e o Fabrício entravam cerca de duas horas mais tarde em suas aulas, e ficavam o dia todo na faculdade, frequentando festas em repúblicas que arrumavam na hora, indo direto da faculdade e só chegando por volta das três da manhã. Como não tínhamos telefone na casa não tinha como avisar, e eu ficava de fora na maioria das vezes.
Já meus compromissos se resumiam em acordar por volta das 5:45 da manhã, preparar um leite com chocolate e um pão com manteiga, pegar minha bicicleta e pedalar cerca de vinte minutos até o cursinho. Almoçava sozinho, geralmente arroz com ovo ou macarronada, e, depois de uma cochilada até as duas, estudava a tarde inteira, assistindo televisão ou lendo quadrinhos à noite. Nos fins de semana que saia com eles, isso quando não estavam cansados pelas farras da semana, mas diziam que fim de semana nem se comparava com farras de meio de semana, pois muita gente voltava para suas cidades e as repúblicas e os barzinhos ficavam mais vazios de estudantes.
Quanto ao cursinho eu realmente estava levando a sério. As salas de aula eram lotadas, com cerca de cento e cinquenta alunos. Os professores davam aulas com microfone, e não se importavam se algum aluno dormisse ou saísse no meio da aula, de modo que a responsabilidade era totalmente nossa. Apesar disso, não precisava me esforçar tanto para prestar atenção, pois os professores eram muito bons, de modo que nos prendiam de um jeito muito interessante. Um problema era que se você não entendesse algo ficava difícil perguntar com tanto aluno e o distanciamento do professor, mas para esse tipo de problema existiam plantões de dúvidas na parte da tarde, que eu frequentava de vez em quando, principalmente nas matérias de exatas.
Como as salas tinham muitos alunos ficava mais difícil fazer amizades, e ficava mais na minha mesmo. Então comecei a reparar numa menina que sempre estava com camisetas de bandas de rock que eu gostava e cadernos com capas de heróis de quadrinhos que eu estava lendo na república. Ela não era bonita: muito branca e ruiva, com sardas no rosto e mais alta do que eu, mas como os gostos batiam achei que seria legal puxar assunto. Me aproximei:
_ Esse herói é da hora.
_ Você gosta também? Sou muito fã dele. Já li todos os quadrinhos.
_ Eu não li todos, mas os que li gostei muito.
_ E banda de rock? Você curte também? – Perguntou mostrando a camiseta.
_ Pra caramba.
_ Eu sou a Juliana.
_ Leonardo. Prazer.
E ficamos papeando até começar a aula.
Com isso a Juliana passou a ser minha única amiga por um tempo. Por um tempo porque logo expandimos as amizades graças aos gostos em comum também, mas não com os alunos do cursinho. A Juliana tinha me dito de um clube da cidade onde toda quarta tocavam bandas de rock e que lá tinha uma biblioteca com uma sessão só de histórias em quadrinhos, e me convidou para ir, dizendo que conseguiria que eu entrasse pelo fato do seu pai ser um dos diretores. Então passamos a frequentá-lo de terça a sexta à noite, participando de algumas atividades do clube, como as bandas e algumas sessões de filme, e as leituras de quadrinhos, expandindo meus gostos que haviam se iniciado desde as conversas com o Borges e as leituras na república. E nisso tudo conhecemos o Eduardo e o Gilberto, fãs de rock e quadrinhos como nós.
O Eduardo era homossexual , revelando isso para nós apenas depois de um tempo, pedindo para que não contássemos para ninguém pelo fato da sua família não saber e não aceitar, então apenas amigos próximos sabiam. O Gilberto era um baixinho com cara de invocado e amigo do Eduardo desde a infância, sendo um nerd quando o assunto era histórias em quadrinhos, sabendo curiosidade de épocas remotas dos heróis quando ele nem havia nascido ainda.
Com isso, cada vez menos saia com meu irmão e o pessoal da república, e passei a me encontrar todos os dias na parte da tarde com a Juliana para estudarmos juntos. Ela ia até a república e enquanto ela me ajudava nas matérias de exata eu a ajudava na área de humanas. Até que começamos a ficar.

_ Oi mãe. Como estão as coisas aí? – Falava a cobrar por um telefone público.
_ Com muita saudade. De você e do seu irmão. Quando vocês vêm?
_ O Lord tá falando do próximo feriado, daqui a duas semanas.
_ Não chame seu irmão assim. O nome dele é Lourenço.
_ Ah, mãe! Convivendo com ele aqui acabei me acostumando. Sabe se o André vai para o feriado também?
_ Falei com a Josefa e ela acredita que sim. Disse que o André não está se adaptando à capital não, e que está pensando em voltar.
_ Mesmo? Que coisa! E o restante da minha turma, tem visto?
_ Encontrei com o Mário outro dia. Ele te mandou um abração e perguntou se você viria no feriado. Parece que vem sua turma toda.
_ Legal. E o pai, tá por aí?
_ Ela tá, mas está deitado. Não tem se sentido muito bem ultimamente.
_ O que ele tem?
_ O médico disse que é gastrite.
_ Vixi!
_ E você? Tá estudando bastante?
_ Tô sim, mãe. Pode ficar tranquila.
_ Estamos confiando em você, Leo.
_ Pode confiar. Beijos.
_ Beijos.
Aquilo me deixou mais feliz. Rever a turma em duas semanas. Não via a hora. Estava com saudades de uma boa bebedeira, já que com essa turma não fazíamos muito isso. Só eu fumava, o que me levou a diminuir bastante, e beber eles só acompanhavam de leve, o que tirava a graça de um porre.

Nos dias seguintes até o feriado muito estudo, rock ‘n roll e quadrinhos. Além da Juliana, claro.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Aos Meus Amigos - 31 (Parte II)

(Não leu desde o inicio? Então aproveite em http://blagoiaba.blogspot.com.br/2013/09/aos-meus-amigos-introducao.html )


As festas de fim de ano já tinham passado, e um novo ano se iniciava. Aquele seria realmente um novo ano, já que nossas vidas todas mudariam, assim como nossa turma se separaria. O clima era de tristeza e euforia. Nos vestibulares apenas o Hugo e o Neuza passaram, sendo que o Hugo faria programação numa faculdade particular a uns 140 quilômetros da nossa cidade e o Neuza tinha passado em comunicação numa estadual bem mais longe. O Mário faria cursinho em outra cidade também, mas continuaria a morar com os pais e viajaria todos os dias num ônibus da prefeitura toda noite. Eu iria para a cidade onde meu irmão estudava em outro estado e o André para a capital do estado com o irmão dele. O Jonatan continuaria com sua jornada diária de trabalhar com o pai e faculdade à noite e o Helinho e o Antônio ainda estavam no colegial.
_ Vai ficar corrido para nos ver. – Disse o Mário. – Mesmo morando aqui ainda, pra passar em medicina vou ter que estudar muito. Mal vou sair.
_ Nem de fim de semana? – Perguntou o Jonatan.
_ Às vezes só. Mas nem sempre. Tenho que estudar muito.
_ E vocês virão sempre pra cá, né? – Perguntou o Antônio para o Neuza, o Hugo, o André e eu.
_ Eu sim, pois não é tão longe. Pelo menos a cada quinze dias eu venho. – Disse o Hugo.
_ Não sei não. Tá um pouco longe para eu vir sempre. Quem sabe uma vez por mês e olhe lá. – Foi a vez do Neuza falar.
_ Com base no tanto que meu irmão vem pra cá, serão poucas vezes no ano. – Eu disse.
_ Dependo do meu irmão também, mas ele vem com mais frequência. – Falou o André.
E ficamos um tempo pensativos, bebendo e fumando nos fundos da casa da vó do Antônio.
O Primeiro a ir embora foi o Hugo. Como a faculdade que faria era particular, suas aulas começariam antes, saindo de nossa cidade num sábado de manhã para que os pais pudessem comprar alguns móveis para ele morar numa república de um pessoal da nossa cidade que já moravam lá. Conhecíamos esse pessoal só de vista, nem sabendo se eram legais ou não.
Logo em seguida foi a vez do André, que partiu para a capital com uma mochila nas costas e uma mala de mão, uma vez que o Rodolfo já tinha arrumado uma cama para ele no apartamento que dividia com mais um amigo. Ele estava empolgado com a vida na cidade grande, mas percebíamos que estava triste por se ver longe dos amigos.
Depois fui eu, partindo numa sexta de manhã para que meus pais pudessem passar o fim de semana comigo e com o meu irmão e acertar as coisas no cursinho que eu faria. Sentia um certo frio na barrida, e certamente sentiria falta da turma.
O Neuza foi o último, pois a estadual começava quase um mês depois da particular e dos cursinhos, e soubemos que ele foi meio em cima da hora, arrumando um lugar para ficar apenas no primeiro dia de aula, conversando com um monte de gente que não conhecia até encontrar uma república que aceitava calouros, ou bixos, como diziam, e que os caras eram uns babacas que ficavam mandando ele fazer um monte de coisas por ser bixo, como lavar banheiro, arrumar os quartos de todos e mais um monte de outras coisas idiotas para humilhá-lo.

_ Já sabe que se não estudar pra valer volta pra casa né? – Disse novamente minha mãe.
_ Eu sei, mãe. Vou estudar pra valer.
_ Leo, manter você e seu irmão em outra cidade não é fácil, mas fazemos isso pensando no futuro de vocês. Espero que não nos decepcione. – Foi a vez do meu pai.
_ Tá bom, pai. Prometo que não vou decepcionar.
Meu irmão me olhava e fazia sinal com as mãos de que eu tinha me fodido, zoando sem que meus pais vissem.
Eu realmente estava disposto a estudar. Sabia que a única forma de não ter que fazer algo como o Jonatan, de trabalhar durante o dia e estudar durante a noite morando com meus pais ainda, era se passasse numa universidade estadual ou federal. Indiretamente esse era o acordo. Se fosse para fazer uma particular faria perto da nossa cidade e usaria o ônibus da prefeitura. Mas um grande problema persistia: Que curso fazer? Meus pais apostavam que ao morar fora e longe deles eu assumiria maior responsabilidade e amadureceria. Era uma aposta arriscada, mas estavam dispostos a pagar para ver, e eu queria mesmo mostrar para eles que conseguiria.
Algumas horas depois chegamos à cidade do meu irmão. Fomos até sua república, onde o Fred, o cachorro, veio nos recepcionar.
_ Ah, moleque! Adivinha quem vai morar aqui com vocês? – Falava ao cachorro, que pulava e mordia meu braço com sua enorme boca, brincando e me deixando todo babado.
Depois da primeira visita ao Lourenço eu já tinha ido mais duas vezes, me familiarizando mais com a cidade e com o pessoal da casa. O Fabrício não estava, percebendo isso de imediato ao notar a ausência do carro, e o Rodrigo estava à frente da televisão, assistindo desenhos animados.
_ Olha o morador novo chegando aí! – Disse ele ao me ver.
_ E aí Rodrigão.
_ Vamos almoçar no shopping então? – Chamou meu pai. – Depois já passamos no cursinho. Quer ir com a gente, Rodrigo?
_ Opa, seu Francisco. Vou sim.
Tiramos minhas coisas e do meu irmão do carro e fomos ao shopping. Eu estava um pouco fora do ar. Ainda não tinha caído a ficha da minha situação de fato.
Depois de comer deixamos meu irmão e o Rodrigo no shopping e fomos até o cursinho. Escolhemos um que era considerado bom e não tão longe da república, de modo que eu pudesse ir de bicicleta todos os dias. Logo que meu irmão se mudou da nossa cidade para lá meus pais levaram sua bicicleta, mas ela nunca tinha sido usada, então eu faria proveito dela.
Meus pais acertaram os detalhes de matrícula, mensalidade e material e voltamos para o shopping. Minhas aulas começariam na segunda, e vi nos materiais que teria duas disciplinas que nunca tinha tido: Filosofia e Sociologia. Aquelas eram matérias que caiam nos vestibulares daquele estado, diferente de onde morávamos, e me lembrei de ter assistido uma palestra sobre um filósofo alemão da primeira vez que conheci o campus em que meu irmão estudava.
_ A partir de segunda-feira é só isso aí que importa, entendeu? – Dizia minha mãe em relação ao material que eu folhava.
_ Eu sei, mãe! – Respondia, já de saco cheio da cobrança.

Passamos um final de semana tranquilo, saindo para passear pela cidade e shopping e comer em alguns restaurantes tradicionais. Deixamos meus pais dormirem no quarto do meu irmão que seria o meu também e dormimos em colchões na sala. No sábado sai com meu irmão, o Fabrício e o Rodrigo, de modo que fomos a um barzinho universitário com som ao vivo cheio de gatinhas. Aquilo me animou, pois agora eu moraria naquela cidade cheia de barzinhos e gatas e festas e tudo mais muito maior que a minha. Bebemos e fumamos, mas ninguém se deu bem com as garotas. Chegamos por volta das quatro da manhã.
_ Vai se acostumando, Leo. O ritmo é esse quase todos os dias da semana.
_ Hahahaha! Massa!!!
_ E vê se leva as garotas do cursinho pras festinhas em casa também. – Falou o Rodrigo.
_ Certeza.
No domingo acordamos quase ao meio dia, com uma bela ressaca, para almoçar com meus pais que iriam embora logo em seguida. Na despedida minha mãe chorava ao me abraçar.
_ A casa vai ficar tão vazia agora!
_ Fica calma, mãe. Vai dar tudo certo.
_ Estuda bastante, ok?
_ Pode deixar, pai. Vou estudar pra valer.
E foram embora. Só então percebi a força das palavras da minha mãe. Realmente, agora seriam só os dois em casa. Pela primeira vez. Pelo menos a Rosália estaria por perto, e o Neto levava muita alegria para eles. Me apegava a essas ideias para evitar chorar também.
_ Então? – Disse o Fabrício.- Vamos comprar umas cervejas?

A vontade de chorar passou na hora...