sexta-feira, 27 de março de 2015

Aos Meus Amigos - 32 (Parte II)

(Não leu desde o inicio? Então aproveite em http://blagoiaba.blogspot.com.br/2013/09/aos-meus-amigos-introducao.html )


Morar na cidade que meu irmão estudava estava legal, mas bem diferente do que eu achava que seria. O ritmo de festas e baladas prometidos quando eu cheguei não era exatamente daquela forma, pois nossos horários e compromissos nunca batiam. O Lourenço, o Rodrigo e o Fabrício entravam cerca de duas horas mais tarde em suas aulas, e ficavam o dia todo na faculdade, frequentando festas em repúblicas que arrumavam na hora, indo direto da faculdade e só chegando por volta das três da manhã. Como não tínhamos telefone na casa não tinha como avisar, e eu ficava de fora na maioria das vezes.
Já meus compromissos se resumiam em acordar por volta das 5:45 da manhã, preparar um leite com chocolate e um pão com manteiga, pegar minha bicicleta e pedalar cerca de vinte minutos até o cursinho. Almoçava sozinho, geralmente arroz com ovo ou macarronada, e, depois de uma cochilada até as duas, estudava a tarde inteira, assistindo televisão ou lendo quadrinhos à noite. Nos fins de semana que saia com eles, isso quando não estavam cansados pelas farras da semana, mas diziam que fim de semana nem se comparava com farras de meio de semana, pois muita gente voltava para suas cidades e as repúblicas e os barzinhos ficavam mais vazios de estudantes.
Quanto ao cursinho eu realmente estava levando a sério. As salas de aula eram lotadas, com cerca de cento e cinquenta alunos. Os professores davam aulas com microfone, e não se importavam se algum aluno dormisse ou saísse no meio da aula, de modo que a responsabilidade era totalmente nossa. Apesar disso, não precisava me esforçar tanto para prestar atenção, pois os professores eram muito bons, de modo que nos prendiam de um jeito muito interessante. Um problema era que se você não entendesse algo ficava difícil perguntar com tanto aluno e o distanciamento do professor, mas para esse tipo de problema existiam plantões de dúvidas na parte da tarde, que eu frequentava de vez em quando, principalmente nas matérias de exatas.
Como as salas tinham muitos alunos ficava mais difícil fazer amizades, e ficava mais na minha mesmo. Então comecei a reparar numa menina que sempre estava com camisetas de bandas de rock que eu gostava e cadernos com capas de heróis de quadrinhos que eu estava lendo na república. Ela não era bonita: muito branca e ruiva, com sardas no rosto e mais alta do que eu, mas como os gostos batiam achei que seria legal puxar assunto. Me aproximei:
_ Esse herói é da hora.
_ Você gosta também? Sou muito fã dele. Já li todos os quadrinhos.
_ Eu não li todos, mas os que li gostei muito.
_ E banda de rock? Você curte também? – Perguntou mostrando a camiseta.
_ Pra caramba.
_ Eu sou a Juliana.
_ Leonardo. Prazer.
E ficamos papeando até começar a aula.
Com isso a Juliana passou a ser minha única amiga por um tempo. Por um tempo porque logo expandimos as amizades graças aos gostos em comum também, mas não com os alunos do cursinho. A Juliana tinha me dito de um clube da cidade onde toda quarta tocavam bandas de rock e que lá tinha uma biblioteca com uma sessão só de histórias em quadrinhos, e me convidou para ir, dizendo que conseguiria que eu entrasse pelo fato do seu pai ser um dos diretores. Então passamos a frequentá-lo de terça a sexta à noite, participando de algumas atividades do clube, como as bandas e algumas sessões de filme, e as leituras de quadrinhos, expandindo meus gostos que haviam se iniciado desde as conversas com o Borges e as leituras na república. E nisso tudo conhecemos o Eduardo e o Gilberto, fãs de rock e quadrinhos como nós.
O Eduardo era homossexual , revelando isso para nós apenas depois de um tempo, pedindo para que não contássemos para ninguém pelo fato da sua família não saber e não aceitar, então apenas amigos próximos sabiam. O Gilberto era um baixinho com cara de invocado e amigo do Eduardo desde a infância, sendo um nerd quando o assunto era histórias em quadrinhos, sabendo curiosidade de épocas remotas dos heróis quando ele nem havia nascido ainda.
Com isso, cada vez menos saia com meu irmão e o pessoal da república, e passei a me encontrar todos os dias na parte da tarde com a Juliana para estudarmos juntos. Ela ia até a república e enquanto ela me ajudava nas matérias de exata eu a ajudava na área de humanas. Até que começamos a ficar.

_ Oi mãe. Como estão as coisas aí? – Falava a cobrar por um telefone público.
_ Com muita saudade. De você e do seu irmão. Quando vocês vêm?
_ O Lord tá falando do próximo feriado, daqui a duas semanas.
_ Não chame seu irmão assim. O nome dele é Lourenço.
_ Ah, mãe! Convivendo com ele aqui acabei me acostumando. Sabe se o André vai para o feriado também?
_ Falei com a Josefa e ela acredita que sim. Disse que o André não está se adaptando à capital não, e que está pensando em voltar.
_ Mesmo? Que coisa! E o restante da minha turma, tem visto?
_ Encontrei com o Mário outro dia. Ele te mandou um abração e perguntou se você viria no feriado. Parece que vem sua turma toda.
_ Legal. E o pai, tá por aí?
_ Ela tá, mas está deitado. Não tem se sentido muito bem ultimamente.
_ O que ele tem?
_ O médico disse que é gastrite.
_ Vixi!
_ E você? Tá estudando bastante?
_ Tô sim, mãe. Pode ficar tranquila.
_ Estamos confiando em você, Leo.
_ Pode confiar. Beijos.
_ Beijos.
Aquilo me deixou mais feliz. Rever a turma em duas semanas. Não via a hora. Estava com saudades de uma boa bebedeira, já que com essa turma não fazíamos muito isso. Só eu fumava, o que me levou a diminuir bastante, e beber eles só acompanhavam de leve, o que tirava a graça de um porre.

Nos dias seguintes até o feriado muito estudo, rock ‘n roll e quadrinhos. Além da Juliana, claro.

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